... sobre as 3 mortes de notáveis deste fim-de-semana...
Porquê? Porque estes momentos estão repletos de lugares-comuns e porque prefiro que escreva quem tem verdadeiramente alguma coisa a dizer.
No entanto, há uma memória que não me sai da cabeça nos últimos dias e que preciso de exorcizar.
Há uns anos, creio que em 98 ou 99, um grupo de amigos meus organizou uma conversa no ISEG com o Álvaro Cunhal. Eu penso que foi por volta de 98 ou 99 porque pelo que me lembro eu ainda era aluno, mas já por lá parava pouco... mas a verdade é que pode ter sido noutra altura... Enfim! Não é relevante! O que é um facto é que Cunhal já estava afastado da cena política activa e estava já bastante mais velho do que eu previa. Estava mais ou menos como aqui:
E a verdade é que por mais voltas que dê à cabeça, não me consigo lembrar do tema da conversa ou se existia sequer tema, nem do que é que Cunhal nos disse ou do que nós lhe dissémos a ele.
A única coisa de que me lembro é de me sentir totalmente esmagado!
Esmagado pelo olhar inteligente e observador de Cunhal (apesar das cataratas que já o atormentavam) e pela sua presença imponente e solene.
Esmagado pela sensação de estar a contemplar um capítulo da História.
Esmagado pela serenidade do homem, que tanto contrastava com a tese já então em voga de que se tratava de um homem derrotado pela História.
E esmagado pela expressão na face de todos aqueles que o contemplavam, que seria provavelmente também a minha, e que independentemente do posicionamento político que tivessem exalavam um profundo respeito pela figura que tinham à frente.
De resto lembro-me apenas da inesperada afabilidade, descontracção e quase intimidade com que decorreu toda a sessão...
Ah! E lembro-me também dos poucos minutos em que conversámos já depois da sessão acabar e de um amigo comum nos ter apresentado. No final da conversa escreveu-me uma dedicatória, na primeira folha do meu exemplar do livro da sua tese sobre o aborto... Poucos anos depois este livro foi roubado, junto com o resto das coisas que estavam na mochila do meu irmão, no parque de campismo da ilha de Tavira! Ao animal que mo roubou, desejo que pelo menos tenha lido o livro!